O governo reconheceu que o atual serviço militar de quatro
meses “não é suficiente para enfrentar uma situação que muda de maneira
rápida e constante”
(crédito: AFP)
Sob constante ameaça de uma invasão da China, Taiwan
decidiu ampliar o tempo do serviço militar obrigatório, de quatro meses para um
ano, dois dias depois de o governo de Xi Jinping realizar os maiores exercícios
militares em torno da ilha. Cada vez mais beligerante, Pequim considera Taiwan
como um território próprio que deve ser recuperado no futuro, inclusive pela
força. A mudança começa a valer a partir de 2024 e vai atingir todos os homens
nascidos após 1º de janeiro de 2005.
“Foi uma decisão extremamente difícil, mas
inevitável para a sobrevivência de Taiwan”, ressaltou a presidente Tsai
Ing-wen, que citou explicitamente a pressão chinesa como motivo da alteração:
“As intimidações e ameaças contra Taiwan estão se tornando cada vez mais
evidentes.”
A mandatária reconheceu que o atual serviço militar de
quatro meses “não é suficiente para enfrentar uma situação que muda de
maneira rápida e constante”. A mudança foi acertada durante uma reunião do
governo sobre a segurança nacional. “Enquanto Taiwan for suficientemente
forte, Taiwan não se tornará um campo de batalha”, disse, acrescentando:
“Ninguém quer a guerra … mas, meus compatriotas, a paz não vai cair do
céu”.
Temores
A pressão militar, diplomática e econômica foi
intensificada no governo de Xi Jinping, que completa uma década como presidente
em 2023. Para ele, a “reunificação” de Taiwan não pode ser deixada
para as futuras gerações. Tsai já declarou que a reintegração a Pequim não é
aceitável para a população da ilha.
A perspectiva de uma invasão chinesa preocupa cada vez
mais Taipé e seus aliados ocidentais, em particular desde o início da ofensiva
da Rússia contra a Ucrânia, que entrou no 11º mês.
Separada de fato da China continental desde 1949, Taiwan
seria amplamente superada em um conflito hipotético, com 88 mil soldados contra
mais de um milhão do Exército de Pequim, segundo as estimativas do Pentágono. A
China também supera a ilha em equipamentos militares.
O serviço militar obrigatório era muito impopular em
Taiwan porque recordava a ditadura que comandou o país por muitas décadas. Em
2017, o governo anterior reduziu o período de um ano para quatro meses com o
objetivo de criar uma força principalmente voluntária. Pesquisas recentes
mostram, no entanto, que mais de 75% dos taiwaneses consideram o período muito
curto.
“Só conseguiremos evitar a guerra se nos prepararmos
para uma guerra. E só podemos impedir uma guerra se tivermos capacidade de
combater uma guerra”, assinalou a presidente no pronunciamento de ontem.
A ilha aumentou o treinamento de reservistas e a compra
de aviões de combate e mísseis para fortalecer suas defesas, mas os
especialistas consideram que isso é insuficiente. “Pelo nível de ameaça e
o exemplo da Rússia na Ucrânia, espero que a população taiwanesa entenda que
essas medidas são necessárias”, disse J. Michael Cole, analista que mora
em Taipé.
Apoio indigesto
Desagrada especialmente Pequim a assistência prestada
pelos Estados Unido. O governo chinês não aceita a política do presidente Joe
Biden para Taiwan, sobretudo depois que o democrata afirmou que Washington
defenderia a ilha em caso de ataque da China.
Em agosto, durante visita de Nancy Pelosi, presidente da
Câmara de Representantes dos EUA, a Taiwan, a tensão entre Pequim e Washington
atingiu um nível máximo. A partir daí, o governo de Xi intensificou o uso de
seus bombardeiros H-6 com capacidade nuclear nas incursões em torno da ilha. As
patrulhas no Estreito de Taiwan se tornaram praticamente diárias.
No sábado, após a aprovação do orçamento dos EUA, a
situação se agravou ainda mais. Os congressistas norte-americanos incluíram US$
2 bilhões em financiamento de armas para Taiwan, permitindo até US$ 10 bilhões
em vendas militares para a ilha pelos próximos cinco anos.
Como resposta, os chineses realizaram as maiores manobras
militares em torno da ilha. Segundo as autoridades taiwanesas, 47 voos
ultrapassaram a zona de defesa de identificação aérea (ADIZ). Seis aviões
SU-30, um dos modelos mais avançados da China, participaram do “exercício
de ataque”, como a ação foi classificada por Pequim.