02/11/2025

Governo Trump acusa Brasil de violar ‘valores democráticos’ em referência a ações de Moraes

Deputado Eduardo Bolsonaro faz périplo nos EUA em lobby contra Moraes - (crédito: Reuters)

Departamento de Estado divulga nota sem citar STF ou ministro do Supremo, mas aludindo a decisões contra redes sociais. Eduardo Bolsonaro visitou sede da diplomacia americana

Em uma nota divulgada em sua conta oficial no X, o Departamento de Estado dos EUA acusou o Brasil de tomar medidas “incompatíveis com valores democráticos” em referência a recentes decisões judiciais do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de remover conteúdos de usuários de algumas redes sociais e de aplicar multas e bloqueios por descumprimentos das ordens.

“O respeito à soberania é uma via de mão dupla com todos os parceiros dos EUA, incluindo o Brasil. Bloquear o acesso à informação e impor multas a empresas sediadas nos EUA por se recusarem a censurar indivíduos que lá vivem é incompatível com os valores democráticos, incluindo a liberdade de expressão”, diz a nota divulgada pela diplomacia americana, que não cita Moraes.

É a primeira vez que a gestão do presidente Donald Trump se manifesta sobre o assunto. A liberdade de expressão irrestrita, como prevista na Primeira Emenda da Constituição dos EUA, é uma das bandeiras do republicano e as chamadas big techs são tidas como apoiadoras da Casa Branca.

Na semana passada, o bilionário Elon Musk, dono do X e chefe do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE), teve sua rede social multada em R$8 milhões por desrespeitar decisões do ministro do STF Alexandre de Moraes de retirar do ar conteúdos considerados como desinformação.

E na sexta-feira passada, a rede Rumble foi bloqueada em território brasileiro por se recusar a constituir representação legal no país e não cumprir com ordens de excluir páginas de usuários da direita brasileira, como o blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, radicado nos EUA.

Além de não citar Moraes, a nota do Departamento de Estado não cita explicitamente as duas empresas, mas faz alusão aos dois casos.

A manifestação acontece depois que o deputado federal Eduardo Bolsonaro foi recebido em uma série de reuniões no Departamento de Estado, em Washington, na última sexta-feira (21/2).

O ministro do Supremo, que está sendo processado na Flórida pela Rumble e pela empresa de mídia de Trump (controladora da Truth Social), nega motivação política em sua atuação e sustenta – nos autos e em palestras – atuar em defesa da legislação e da democracia do Brasil.

Procurado sucessivas vezes pela reportagem via STF, ele não comentou a ofensiva.

Esta semana, em comentários no próprio X, Musk sugeriu que Moraes pode ser alvo de sanções no país. Em comentário a uma postagem, Musk pergunta: “Moraes não tem propriedades nos EUA?”

“Eu não sei se o Alexandre de Moraes ficou mal acostumado a trocar farpas com Elon Musk quando ele era só um empresário, mas agora ele é praticamente ministro do governo Trump, a situação é diferente”, disse o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) à BBC News Brasil.

“Não esperem que o Trump vai receber com naturalidade se o governo do Brasil ficar chutando o X, tratando assim. Ele é um businessman”, diz Eduardo, relembrando que a primeira-dama Janja da Silva proferiu insulto público ao bilionário durante reuniões do G-20 no Rio de Janeiro no ano passado.

Campanha bolsonarista e projeto contra Moraes

Como a BBC News Brasil revelou, Eduardo Bolsonaro esteve com o embaixador americano Michael Kozak, alta autoridade do Escritório de Hemisfério Ocidental do Departamento de Estado, de onde partiu a nota divulgada nesta quarta-feira.

Consultado oficialmente na última sexta-feira pela BBC News Brasil, o Departamento de Estado se recusou a detalhar o que foi tratado nas reuniões com Eduardo Bolsonaro. Em entrevista à BBC News Brasil, o deputado federal disse que não divulga suas agendas com o Executivo dos EUA.

Desde a posse de Trump, em 20 de janeiro, Eduardo já esteve no país três vezes. A quarta viagem está marcada para a semana que vem. Ele tem se encontrado com uma dezena de parlamentares além de expoentes da direita americana.

Também nesta quarta, a Comissão de Justiça da Câmara dos Representantes aprovou um projeto de lei criado para atingir Moraes. Batizado de ”No Censors on our Shores Act”, ou algo como “Lei Sem Censores dentro de nossas Fronteiras”, o projeto de lei prevê a deportação e inadmissibilidade em território americano de autoridades estrangeiras que tenham infringido a Primeira Emenda da Constituição dos EUA sobre liberdade de expressão.

Foi inicialmente proposto pelo deputado republicano Darrell Issa no fim do ano passado, quando Moraes havia bloqueado o X em território brasileiro, depois que Musk se recusou a cumprir ordens da Corte e estabelecer representantes legais no país. Mais tarde, Musk recuou. O projeto de lei agora vai ao plenário da Câmara, onde republicanos têm ligeira maioria.

O périplo de Eduardo nos EUA foi intensificado após denúncia da Procuradoria Geral da República (PGR) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, apontado como líder de suposta organização criminosa com o objetivo de dar um golpe de Estado – o ex-presidente nega todas as acusações.

O deputado federal reconhece que a iniciativa visa fortalecer a posição do grupo para as eleições de 2026 e obter sanções econômicas e de viagem contra o ministro Alexandre de Moraes.

Até esta quarta, 26/1, porém a Casa Branca e seus departamentos não tinham entrado na disputa. Questionado sobre o silêncio do Executivo até então, Eduardo afirmou que “ele [Trump] precisa entender tudo certinho. O mais comum é que as coisas [vindas do Executivo] aconteçam de maneira mais silenciosa”.

O deputado, no entanto, demonstrou confiança de que a Casa Branca possa intervir para garantir seu pai, Jair Bolsonaro, na urna eletrônica em 2026. Bolsonaro está inelegível até 2030 por decisão do Tribunal Superior Eleitoral.

“Ele [Trump] mais do que ninguém sabe como funciona o ‘lawfare’, então a gente tem que vocalizar, mostra que o problema não é de toda a Suprema Corte, é do Alexandre de Moraes, e já temos argumentos de sobra pra provar que ele merece receber sanções OFAC”, diz Eduardo.

em referência aos múltiplos processos judiciais de Trump, que o então presidenciável sempre disse serem perseguição política e a exclusão dele de múltiplas plataformas após os ataques de 6 de janeiro ao Capitólio.

OFAC é a sigla em inglês para Escritório de Controle de Propriedades Estrangeiras, órgão responsável por impor sanção econômica e de viagem a estrangeiros e ligado ao Departamento de Tesouro dos EUA.

A nota desta quarta também é uma inflexão ao que o próprio Departamento de Estado declarou sobre a contenda do X com o Judiciário do Brasil em ocasiões anteriores.

“Estamos acompanhando a situação. O X, como uma empresa privada com negócios em muitos países, tem que conduzir seus negócios independemente. Não é algo em que o governo americano se envolva”, afirmou à BBC News Brasil a porta-voz do órgão Amanda Roberson há apenas quatro meses.

O Itamaraty tem acompanhado de perto as movimentações da gestão Trump em relação ao Brasil e a Moraes. Consultado pela BBC News Brasil, o órgão não informou se haverá resposta pública da diplomacia brasileira.

Reservadamente, um embaixador com conhecimento da relação dos dois países disse que “a nota do departamento de Estado desrespeita princípios da relação bilateral entre Brasil e EUA”. A chancelaria brasileira ainda delibera se e qual será a resposta pública do país.

Tribuna Livre, com informações da BBC News

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