Decano do Supremo nega pedido da AGU para rever decisão que impôs restrições à abertura de processo contra magistrados. Para o colega Flávio Dino, crise com Congresso tem “gritaria demais e reflexão de menos”
O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, rejeitou, ontem, o pedido de reconsideração feito pela Advocacia-Geral da União (AGU), após suspender dispositivos da Lei do Impeachment, de 1950, relativos ao afastamento de membros da Suprema Corte. Ele também negou que a decisão liminar (provisória) tenha sido tomada para blindar os ministros da Corte. Para Mendes, a Lei do Impeachment “caducou”.
Ele considerou a solicitação da AGU incabível, justificando que o ordenamento jurídico brasileiro não prevê esse tipo de recurso. Ele reforçou que, em sua avaliação, os requisitos para a concessão da medida cautelar provisória que dificultou a abertura de processo de impeachment contra ministros permanecem presentes.
“A medida cautelar deferida (anteontem), além de encontrar fiel amparo na Constituição Federal, mostra-se indispensável para fazer cessar um estado de coisas manifestamente incompatível com o texto constitucional. Inexistem, portanto, razões para alteração dos termos da decisão”, argumentou Mendes, em sua decisão.
A liminar, proferida ao julgar ações propostas pelo partido Solidariedade e pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), estabeleceu duas restrições significativas e suspendeu um trecho específico da legislação de 1950. A principal mudança restringe quem pode protocolar pedidos de impeachment contra ministros do Supremo. Pela lei, qualquer cidadão tinha essa prerrogativa, mas, com a decisão do Mendes, apenas a Procuradoria-Geral da República (PGR) poderá fazê-lo.
Gilmar Mendes afirmou que sua decisão de restringir essa prerrogativa à PGR é indispensável para cessar um estado de coisas manifestamente incompatíveis com o texto constitucional.
“Lente de simetria”
Colega de Mendes no STF, o ministro Flávio Dino saiu em defesa da liminar proferida pelo colega, citando o contexto e a defasagem da legislação de 1950, que precisa ser revista. Para ele, a liminar de Gilmar Mendes buscou atualizar a lei “sob uma lente de simetria” com o processo de impedimento de um presidente da República.
Dino lamentou que o cenário político atual seja marcado por “gritaria demais e reflexão de menos”, e vê a necessidade de “equilibrar os vértices do triângulo”. Citou, ainda, como ameaça, o acúmulo inédito de pedidos de impeachment de magistrados: já são 81 apresentados ao Senado.
Para o ministro, esse número é um “quadro fático que desafia a realidade”, e que tal acúmulo “jamais aconteceu no Brasil e em nenhum país do planeta Terra”. Ele destacou que a maioria desses 81 pedidos é direcionada ao ministro Alexandre de Moraes, relator das ações que julgam os envolvidos na chamada trama golpista de 2022, e sugeriu que isso levanta a questão de que se trata de um “serial killer” de pedidos para “perseguição” e “chantagem”.
“O que temos que analisar é se há pedidos que tenham plausibilidade ou se é mais um capítulo da desconstrução poética e arquitetônica de (Oscar) Niemeyer e Lúcio Costa. O ministro (Gilmar Mendes) traz essa reflexão, propõe uma atualização de uma lei, é uma lei de 1950”, comentou o ministro, em um evento sobre segurança jurídica.
Dino, sem adiantar seu voto — que deve ser proferido em 12 de dezembro —, manifestou a esperança de que a discussão suscitada pelo julgamento do STF sirva como um “estímulo para o Congresso legislar sobre o assunto”.
Tribuna Livre, com informações do STF