27/12/2025

Congresso derruba metade dos vetos de Lula e muda dinâmica de governabilidade

Foto: Ricardo Stuckert/Planalto

Em três anos, os congressistas apreciaram 87 vetos, dos quais 43 foram rejeitados

O Congresso Nacional derrubou quase metade dos vetos presidenciais de Lula (PT) analisados desde 2023. A proporção, inédita em duas décadas e superior à do governo de Jair Bolsonaro (PL), reforça a existência de um novo padrão de governabilidade no país, com tendência de perda de controle de agenda pelo Executivo.

Em três anos, os congressistas apreciaram 87 vetos, dos quais 43 foram rejeitados. A média de 49% fica acima da registrada no governo Bolsonaro, mas a diferença é ainda maior em relação às gestões de Michel Temer (MDB), Dilma Rousseff (PT), Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e às anteriores do próprio Lula.

Para além de um contexto de fragmentação da base governista, o resultado revela a consolidação de uma nova lógica do presidencialismo de coalizão. Especialistas dizem que é um reflexo de mudanças institucionais e do fortalecimento do Congresso frente ao Executivo.

O levantamento foi realizado pela Folha a partir de dados do Painel Legislativo Galileu, mantido pelo Senado Federal. A análise considerou tanto os vetos totais quanto parciais apreciados pelo Congresso desde 1999 e o ano da oposição das matérias.

Cada matéria foi contabilizada uma única vez (independentemente do número de dispositivos). Foram descartadas aquelas ainda em tramitação, que tenham sido mantidas na íntegra ou cuja análise tenha ficado prejudicada.

Os textos foram então classificados por ano, conforme o governo em vigor (no caso de Temer, considerou-se 2016 na integralidade). Por fim, os vetos analisados e os vetos derrubados foram agregados por governo para o cálculo da razão.

Nos governos FHC e Lula 1 e 2, a rejeição de vetos tinha um caráter pontual. O tucano teve um veto derrubado; Lula, quatro. Entre 2000 e 2010, o índice agregado variou de 1% a 1,6%. O Planalto passou por anos sem nenhum veto rejeitado.

O padrão se manteve nas gestões Dilma 1 e 2. Apesar de um aumento no número absoluto de vetos derrubados, o percentual de rejeitados não chegou nem a 5%. Foram 7 dos 142 vetos.

A partir de Michel Temer, começou a haver uma mudança. O Congresso rejeitou 21 de 144 vetos analisados. A taxa beirou 15%. O percentual subiu para 44% com Bolsonaro, com 114 dos 258.

Neste mês, Lula já anunciou que vetará o PL da Dosimetria, aprovado pela Câmara e pelo Senado e que prevê a redução de penas para Bolsonaro e demais acusados pela trama golpista e pelo 8 de Janeiro. O Congresso, porém, poderá derrubar o veto do petista.

O professor Fernando Meireles, da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), diz que hoje o processo de tramitação de vetos é mais simplificado do que era até o primeiro mandato de Dilma, o que reduz o custo de rejeição. Isso se deve a uma mudança no regimento interno do Congresso.

Para rejeitar um veto, é preciso maioria absoluta dos votos de deputados (257) e senadores (41). A análise é feita em sessão conjunta, mas os congressistas costumavam deixar as votações de lado, o que resultava em um acúmulo de matérias a serem analisadas.

A Constituição define um prazo de 30 dias para a apreciação, mas, antes de uma resolução de 2013, a contagem dependia da convocação de uma sessão. A partir de então, o período passou a ser contado já a partir do registro do veto pelo Congresso.

Além disso, o regimento estabeleceu uma data fixa para convocação de sessão, a terceira terça-feira de cada mês, e definiu que a apreciação deveria ocorrer independentemente da formação ou relatório de uma comissão mista.

“Para o Legislativo, isso é um rito corriqueiro”, diz Meireles.
Nesse cenário, o dado mais relevante não é a quantidade de vetos. A variação no percentual de derrubados, por outro lado, pode indicar dificuldades de interlocução e de controle da agenda legislativa pelo Executivo, afirma o professor.

Professora da UFPR (Universidade Federal do Paraná), Graziella Testa afirma que a frequência com que vetos têm sido rejeitados no Congresso é um indicativo de que o presidencialismo de coalização no formato que funcionava 15 anos atrás não existe mais.

“Ainda temos um presidencialismo de coalização. Sempre tivemos um Congresso com um papel relevante, mas hoje temos um Congresso que funciona de forma muito coesa e que se coloca diante do Executivo por conta dessa coesão”, diz ela.

De acordo com a pesquisadora, em um contexto mais amplo da relação com o Legislativo, o Planalto tem hoje menos ferramentas e prerrogativas para construir governabilidade.

Para o cientista político Rafael Silveira, professor do IDP e da escola de governo do TCU (Tribunal de Contas da União), há um componente estrutural e outro conjuntural nesse movimento.

O primeiro é o fato de o Congresso ter passado a analisar vetos de forma mais sistemática. Isso deve permanecer. O percentual, no entanto, pode ter um caráter de momento e variar conforme o alinhamento político entre os Poderes.

Segundo ele, a tendência futura vai depender do resultado eleitoral. Se Lula, que lidera as pesquisas para as eleições de 2026, obtiver uma margem confortável de votos, seu poder de barganha tende a aumentar e, com isso, a taxa de vetos derrubados cairia.

Em um cenário de votação acirrada, como ocorreu em 2022, por outro lado, a expectativa é de manutenção de percentuais elevados, em reflexo da maior tensão entre os Poderes.

Tribuna Livre, com informações da FOLHAPRESS

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