29/09/2025

Ex-detento que passou meses em solitária de Alcatraz comenta plano de Trump para reabrir prisão

Charlie Hopkins passou três anos na prisão de Alcatraz, depois de causar problemas em outras penitenciárias americanas - (crédito: National Archives)

Charlie Hopkins pode ser o último ex-detento de Alcatraz ainda vivo. Ele conta sobre suas experiências na prisão, suas dificuldades de comportamento e os planos de reabertura do presídio de segurança máxima, pelo presidente americano Donald Trump.

Quando vêm à mente de Charlie Hopkins os três anos que ele passou em uma das prisões mais famosas dos Estados Unidos, o que ele mais se lembra é do “silêncio mortal”.

Em 1955, Hopkins foi enviado para Alcatraz, a famosa prisão em uma ilha isolada no litoral de São Francisco, no Estado americano da Califórnia. Ele havia causado problemas em outras prisões, durante o cumprimento da sua pena de 17 anos de prisão por sequestro e roubo.

Ele conta que, à noite, quando adormecia em sua cela, o único som naquela remota ilha era o apito dos navios passando.

“É um som solitário”, relembra Hopkins. “Ele faz lembrar Hank Williams [1923-1953] cantando aquela música [que diz] ‘estou tão só que poderia gritar’.”

Agora com 93 anos e morando na Flórida, Hopkins conta que, segundo os Arquivos Nacionais de São Francisco, ele provavelmente é o último ex-prisioneiro de Alcatraz ainda vivo. Outro ex-detento, William Baker, aparentemente estava vivo no ano passado.

Alcatraz serviu de cenário para o filme A Rocha (1996). Em entrevista à BBC, Hopkins descreveu como era a vida na ilha, onde ele fez amizades com gângsteres e, certa vez, ajudou em um plano de fuga, sem sucesso.

A prisão de Alcatraz está fechada há décadas, mas, recentemente, o presidente americano Donald Trump afirmou que deseja reabri-la como presídio federal.

Hopkins foi transferido em 1955 de uma penitenciária em Atlanta, no Estado americano da Geórgia, para a prisão de segurança máxima. Ele lembra que, na época, ela era limpa, mas inóspita. E eram poucas as distrações – não havia rádio e os livros eram poucos, segundo ele.

“Não havia nada para fazer”, ele conta. “Você podia andar para frente e para trás na sua cela ou disputar braço de ferro.

Hopkins se mantinha ocupado, por parte do tempo, com seu trabalho na limpeza de Alcatraz. Ele varria os pisos e os esfregava “até que ficassem brilhando”, segundo ele.

Ele foi para a prisão em 1952 na cidade de Jacksonville, na Flórida, por ter participado de uma série de assaltos e sequestros. Hopkins fazia parte de um grupo que levava reféns para atravessar bloqueios nas estradas e roubar carros, segundo ele.

Tentativas de fuga

Em Alcatraz, Hopkins tinha vizinhos muito conhecidos. A prisão recebeu muitos criminosos violentos ao longo dos seus 30 anos de operação.

Alguns deles foram o gângster Al Capone (1899-1947); o assassino Robert Stroud (1890-1963), conhecido como o “Homem-Pássaro” de Alcatraz; e o senhor do crime James “Whitey” Bulger (1929-2018). Por isso, a prisão acabou se tornando o cenário de diversos filmes e programas de televisão.

Com seus nove hectares a 2 km da costa de São Francisco e rodeada por águas congelantes e fortes correntes marítimas, Alcatraz era originalmente um forte de defesa naval, reconstruído no início do século 20 como uma prisão militar.

Nos anos 1930, o Departamento de Justiça dos Estados Unidos assumiu a prisão e a transformou em uma penitenciária federal, como parte do combate ao crime organizado, que, na época, crescia de forma desenfreada nos Estados Unidos.

Mesmo na prisão de segurança máxima, Hopkins afirma que ainda conseguia se meter em problemas. Ele passou muitos dias no “Bloco D” do presídio, confinado na solitária, onde eram mantidos os detentos com mau comportamento, que raramente saíam de suas celas.

Seu período mais longo naquele bloco foi de seis meses. Ele havia tentado ajudar vários outros prisioneiros a escapar de Alcatraz, Hopkins conta que um deles era o famoso ladrão de bancos Forrest Tucker (1920-2004).

Ele os ajudou a roubar lâminas de serra da oficina de eletricidade da prisão, para cortar as barras da cozinha no porão.

Mas o plano não funcionou. Os guardas prisionais descobriram as lâminas nas células de outros detentos, segundo Hopkins.

“Alguns dias depois que eles ficaram trancados, foi a minha vez”, ele conta. Mas isso não impediu um dos detentos.

Em 1956, quando Tucker foi levado a um hospital para uma cirurgia renal, ele atingiu seu tornozelo com um lápis, para que os guardas precisassem retirar os ferros das suas pernas, declarou Tucker à revista The New Yorker.

E, quando foi levado para o raio-X, ele contou que dominou os assistentes do hospital e fugiu.

Tucker foi encontrado e capturado horas depois em um campo de milho, vestindo uma camisola do hospital

Com mais prisioneiros tentando escapar de Alcatraz ao longo dos anos, as autoridades aumentaram a segurança, segundo Hopkins. “Quando saí dali em 1958, a segurança era tão rigorosa que você não conseguia respirar”, relembra ele.

Ao todo, houve 14 tentativas de fuga diferentes ao longo dos anos, envolvendo 36 detentos, segundo o Serviço Nacional de Parques dos Estados Unidos.

Um dos episódios mais famosos envolveu Frank Morris e os irmãos Clarence e John Anglin. Os presos escaparam em junho de 1962, colocando cabeças de papel machê nas suas camas e atravessando pelos dutos de ventilação.

Os três nunca foram encontrados, mas o FBI concluiu que eles teriam se afogado nas águas frias em volta da ilha.

Um ano depois, a prisão foi fechada. O governo determinou que seria mais econômico construir novas prisões do que manter a instalação em operação naquela ilha remota.

Atualmente, Alcatraz é um museu público, visitado por milhões de pessoas todos os anos. Ele gera uma receita anual de US$ 60 milhões (cerca de R$ 341 milhões) para os responsáveis pelo parque.

A construção é decadente. A tinta está descascando, há canos enferrujados e banheiros degradados nas suas celas apertadas.

A construção da prisão principal começou em 1907 e mais de um século de exposição aos elementos deixou o local quase inabitável.

Mas Trump declarou em 4 de maio sua intenção de que o governo reabra e amplie a prisão da ilha para deter os “criminosos mais violentos e implacáveis” do país.

Alcatraz “representa algo muito forte, muito poderoso” – a lei e a ordem, segundo Donald Trump.

Mas os especialistas e historiadores afirmam que a proposta de Trump de restabelecer a prisão é improvável. Seriam necessários bilhões de dólares para reparar e equiparar Alcatraz às demais instalações federais.

Charlie Hopkins concorda. Para ele, “seria muito caro”.

“Naquela época, o sistema de esgoto ia para o oceano”, ele conta. “Eles precisariam criar outra forma de lidar com aquilo.”

Hopkins saiu de Alcatraz cinco anos antes da prisão fechar para sempre.

Ele havia sido transferido para uma penitenciária em Springfield, no Estado americano de Missouri. Lá, ele recebeu medicação psiquiátrica, que melhorou seu comportamento e o ajudou a curar feridas psicológicas, segundo ele.

Hopkins é ávido apoiador de Trump e não acredita que a proposta do presidente americano seja algo sério.

“Na verdade, ele não quer abrir aquele lugar”, afirma ele. Para Hopkins, Trump tenta “transmitir uma mensagem para o público” sobre a punição dos criminosos e das pessoas que entram nos Estados Unidos ilegalmente.

Hopkins foi libertado em 1963. Ele passou a trabalhar, primeiramente, em uma oficina de caminhões, antes de assumir outros empregos.

Ele voltou para o seu Estado natal da Flórida, onde, hoje, tem uma filha e um neto.

Depois de várias décadas refletindo sobre seus crimes e sobre sua vida em Alcatraz, ele escreveu um livro de memórias de 1 mil páginas. Cerca da metade do livro detalha seu comportamento problemático, segundo ele.

“Você não acreditaria nos problemas que causei quando estava ali”, ele conta. “Agora, olhando para trás, consigo ver que eu tinha problemas.”

Tribuna Livre, com informações da BBC News

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