Decisão do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ) afirma que magistrado estaria ‘adotando conduta incompatível com
seus deveres funcionais de magistrado’
Natália Santos e Luiz Vassallo
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil /
Publicações sobre o impeachment da ex-presidente Dilma
Rousseff (PT), críticas à Polícia Militar nos atos antidemocráticos em Brasília
e à politização da Operação Lava Jato motivaram a suspensão das redes sociais
do juiz da Vara de Execuções Penais de Manaus, Luis Carlos Valois, por decisão
do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Conhecido como juiz garantista, crítico a guerra às drogas
e às condições precárias do sistema penitenciário, Valois chegou a ser chamado
pelo secretário de Segurança Pública do Amazonas para ajudar na negociação com
presos que realizavam um motim, que terminou com 56 mortos – o maior número
desde o massacre do Carandiru, nos anos 1990.
O magistrado é ativo nas redes sociais, e, não raro, faz
manifestações políticas. A decisão que levou à derrubada de suas redes sociais,
do corregedor nacional de Justiça, Luis Felipe Salomão, se baseou no artigo 95
da Constituição Federal que veda a juízes “dedicar-se à atividade
político-partidária”. Uma resolução de 2019 do CNJ vai além e proíbe
“manifestar-se em apoio ou crítica públicos a candidato, lideranças
políticas ou partidos políticos”.
Uma das publicações de Valois que motivaram a derrubada
de suas contas foi sobre a ex-presidente Dilma Rousseff. “Diante de um
impeachment sem crime de responsabilidade (pressuposto legal), inclusive com
arquivamento de inquérito posterior, as circunstâncias , os personagens e tudo
mais, acho muito justo e reparador a presidente Dilma passar a faixa!”,
disse o magistrado, em 28 de dezembro.
Após os atos bolsonaristas que destruíram o plenário do
Supremo Tribunal Federal, o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional, o
magistrado publicou uma charge que retratava um policial ao lado de um
bolsonarista de camisa verde e amarela. Na imagem, ambos tiram uma selfie, e o
policial diz: “Depois, manda lá no grupo”, diz.
Em outra publicação, Valois concordou com uma declaração
do cientista político Rafael Viegas, da FGV, que pesquisa o poder Judiciário.
“O protagonismo político de integrantes do MPF e da Justiça Federal (Lava
Jato) foi desastroso para o país. É indissociável da ascensão da extrema
direita e da violência política”, disse Viegas. Ao republicar a
declaração, Valois afirmiou: “Eu avisei isso daí também, faz tempo, e
quase perco o emprego”.
Em sua decisão, Salomão afirmou que “a conduta
individual do magistrado com conteúdo político-partidário macula a confiança da
sociedade em relação à credibilidade, à legitimidade e à respeitabilidade da
atuação da Justiça, atingindo o próprio Estado de Direito que a Constituição
objetiva resguardar”. O ministro pediu que as plataformas de redes sociais
sejam comunicadas com urgência a derrubar as redes de Valois.
“Evidentemente, a manifestação de pensamento e a
liberdade de expressão são direitos fundamentais constitucionais dos
magistrados, dentro e fora das redes sociais. Não são, no entanto, direitos
absolutos. Tais direitos devem se compatibilizar com os direitos e garantias
constitucionais fundamentais dos cidadãos em um Estado de Direito, em especial
com o direito de ser julgado perante um magistrado imparcial, independente e
que respeite a dignidade do cargo e da Justiça”, anotou.
Na manhã desta terça-feira, 17, o juiz afirmou em uma
rede social que não sabia o motivo ainda dos bloqueios e que não teria recebido
uma intimação até o momento. “Não sei o motivo ainda, não fui intimado,
mas até em respeito à decisão do CNJ não me manifestarei nas redes mesmo com a
conta ainda não bloqueada. Vocês não verão da minha parte nenhuma queixa ou
acusação de pessoas, se institucionalmente eu errei, que isso seja resolvido de
forma justa”, disse.