Governantes dos países mais industrializados do planeta, reunidos na Itália, chegam a acordo para emprestar US$ 50 bilhões a Kiev. Dinheiro será proveniente de juros de ativos de Moscou congelados. Biden e Zelensky firmam pacto de segurança de 10 anos
A 50ª edição da cúpula do G7 — os sete países mais industrializados do mundo (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido, além da União Europeia) — começou nesta quinta-feira (13/6), no resort italiano de Borgo Egnazia, com dois recados para o presidente russo, Vladimir Putin. Os países do grupo acordaram um empréstimo bilionário para a Ucrânia, usando juros gerados por ativos russos congelados pelo Ocidente. “Confirmo-lhes que chegamos a um acordo político para dar um apoio financeiro adicional à Ucrânia de aproximadamente US$ 50 bilhões (cerca de R$ 268 bilhões) até o fim deste ano”, disse a primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, anfitriã do encontro. Por sua vez, os presidentes Joe Biden (EUA) e Volodymyr Zelensky (Ucrânia) anunciaram um acordo de segurança com duração para os próximos 10 anos, a fim de apoiar a ex-república soviética diante da invasão russa.
“Os Estados Unidos estão enviando um poderoso sinal de nosso forte apoio à Ucrânia, agora e no futuro”, indicou um comunicado americano que acompanha o acordo de segurança, pouco antes da assinatura do acordo. Por meio do pacto, os EUA se comprometem a treinar o Exército ucraniano, fornecer equipamentos de defesa, realizar exercícios e cooperar na indústria de defesa. Durante entrevista coletiva ao lado de Joe Biden, Zelensky afirmou que o acordo com Washington é “uma ponte para a entrada da Ucrânia na Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte)”. Pouco depois, em discurso no resort situado na região de Apúlia, o ucraniano agradeceu os líderes pelo apoio e declarou que a ajuda será usada “tanto para a defesa como para a reconstrução” de seu país.
A agência France-Presse (AFP) informou que a liberação do empréstimo dos juros de ativos russos envolve uma operação financeira complexa. Não se sabe o que ocorreria se os ativos fossem descongelados, em caso de um acordo hipotético com Moscou, ou quem assumiria o risco em caso de inadimplência. Um alto funcionário da Casa Branca disse à AFP que os EUA se comprometeriam com o repasse de até US$ 50 bilhões, mas que a contribuição poderia ser “significativamente menor”, em caso de um financiamento compartilhado.
Em um gesto de forte simbolismo, Meloni convidou Zelensky a participar de uma reunião de trabalho especialmente voltada a debater a guerra da Ucrânia. Além de Biden, também estavam presentes os líderes Emmanuel Macron (França), Olaf Scholz (Alemanha), Justin Trudeau (Canadá), Fumio Kishida (Japão) e Rishi Sunak (Reino Unido). Zelensky pediu ao G7 o confisco dos ativos congelados de Moscou e o fornecimento de defesa antiaérea mais robusta. Nesta sexta-feira (14), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva participará da cúpula do G7, onde se reunirá com o papa Francisco, com Biden, com Macron e com outros chefes de Estado e de governo.
O ucraniano Petro Burkovsky — analista da Fundação de Iniciativas Democráticas Ilko Kucheriv (em Kiev), hoje soldado em Donbass — considera que a decisão do G7 abre um precedente importante. “Isso estabelece um padrão para o repasse de ajuda financeira à Ucrânia pelos próximos dois ou três anos. A soma total dos ativos russos é de cerca de US$ 300 bilhões (ou R$ 1,6 trilhão). Se essa abordagem for adotada, espero que todo o dinheiro seja usado em apoio à Ucrânia até o fim de 2026”, explicou ao Correio, por meio do WhatsApp. “Também é um forte sinal para a Rússia. Putin deve interromper a invasão imediatamente ou verá seu dinheiro ser usado para aumentar as chances da Ucrânia de esmagar seu exército.”
Incógnita
Em relação ao acordo firmado entre Kiev e Washington, Burkovsky ressalta que o documento não tem caráter vinculativo. “A substância da cooperação dependerá de como as relações entre a Ucrânia e os Estados Unidos se desenvolverão depois das eleições presidenciais norte-americanas de 5 de novembro.” De acordo com Anton Suslov, especialista da Escola de Análise Política (em Kiev), a Ucrânia necessita de US$ 50 bilhões por ano enquanto durar a guerra. “A ajuda financeira externa não pode ser usada para despesas militares. Por isso, o governo de Zelensky tem que cobrir todos os gastos bélicos por conta própria e depender da ajuda de parceiros para financiar outros setores da economia. Por isso, a decisão de utilizar os juros dos ativos russos é crucial”, admitiu à reportagem.
Suslov crê que o financiamento anunciado na cúpula do G7 não apenas cobrirá as necessidades para o próximo ano, mas também representará uma solução duradoura, à medida que os juros, e não diretamente os ativos, são utilizados. “Outro ponto é que esse empréstimo, especificamente, pode ser usado para fins militares.”
Todos os holofotes sobre ela
A primeira-ministra Giorgia Meloni aproveita os holofotes internacionais para destacar sua liderança. Simpática com a imprensa, chegou a posar para uma selfie com os jornalistas e fotógrafos ao fundo. Também fez caras e bocas ao receber o premiê britânico, Rishi Sunak, e o chanceler alemão, Olaf Scholz. Luigi Di Gregorio, cientista político da Università della Tuscia, em Viterbo (centro-oeste da Itália), disse ao Correio que Meloni chega à cúpula do G7 impulsionada por sua “excelente performance” nas eleições europeias e por liderar um governo com forte legitimidade popular.
“O G7 é uma plataforma crucial e uma vitrine importante, que Giorgia Meloni, sem dúvida, aproveitará para melhorar o seu perfil internacional e para alterar a percepção entre diversos segmentos da opinião pública internacional que ainda questionam a sua adequação para a sua posição”, explicou Di Gregorio.
De acordo com ele, a liderança de Meloni é caracterizada por seu carisma, pela capacidade de comunicação e pela autenticidade. “Ela permanece credível em todas as circunstâncias, seja no G7 ou entre a população. Este é um valor acrescentado significativo para a liderança política contemporânea.”
Tribuna Livre, com informações da Agence France Presse.