12/07/2025

Visita a cemitérios: pessoas buscam no passado elementos para ler o presente, explica antropólogo

Foto: Jucimar de Sousa

Existem razões científicas por trás desses comportamento; confira

Milhares de pessoas são esperadas nos principais cemitérios de Goiânia neste Dia de Finados (2/11), uma tradição tão antiga quanto a humanidade que representa uma forma prática de lidar com a vida, para além de habituais questões sentimentais, como saudade e a necessidade de manter, de forma positiva, a memória de quem se foi. O costume mantido e valorizado por adultos maduros e idosos, entretanto, ainda não atrai os jovens. De acordo com o antropólogo Manuel Filho, professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) e estudioso da Memória Social, existem razões científicas por trás desses comportamentos.

A explicação, segundo Manuel, tem início do ponto de vista neurológico. “Com o passar dos anos, o idoso vai perdendo a capacidade de registros na parte frontal do cérebro com relação ao que acontece no presente. Essa dificuldade natural em acompanhar as coisas do acontecimento, como jovens e pessoas maduras fazem, faz com que os mais velhos, diante do fim da vida, se voltem para o passado para fazer leituras do tempo presente“.

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Essas pessoas fazem, então, recortes de momentos importantes que viveram e usam esses elementos para dar sentido à própria vida e para recuperar sua própria identidade. “A gente fala que o passado só tem sentido diante do presente. Fazer a leitura da atualidade com base no passado é um movimento de reconstrução de autoestima”, explica Manuel.

Conforme expõe o professor, é nesse contexto, que cemitérios, túmulos e lápides se tornam itens de importância simbólica inquestionável do ponto de vista cultural.

“Os túmulos são a materialidade cultural da memória. A identidade, principalmente para os ocidentais, tem uma necessidade muito grande de se materializar em objetos. Por isso, quando alguém se vai, pessoas próximas guardam bonecas, anéis, brinquedos, coisas que agem como semiófaro – ou seja, símbolo – de significação desse pertencimento ao mundo”.

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Para Manuel, a idade avançada faz aumentar a necessidade que as pessoas sentem de recorrerem ao passado para entenderem o mundo presente. “Temos necessidade de retomar o passado para nos fazermos vivos no presente. Por isso temos um dia ritual, para lembrar a importância da morte na vida das pessoas. A morte, na leitura antropológica, não é apenas morte, mas também é vida”.

Enquanto idosos se agarram às tradições, jovens têm outras ocupações

Manuel Filho, que também é diretor do Museu Antropológico da UFG, tem hipóteses para explicar o afastamento do público jovem da tradição de visitação de cemitérios. Uma das possíveis razões, segundo ele, seria a fugacidade da vida, o fluxo de informações e a necessidade, para essas pessoas, de se viver o agora.

“O jovem está, muitas vezes, tão ocupado no consumismo das relações sociais e tão preocupado em desenvolver inúmeros papeis sociais que a morte é uma questão que se torna cada vez mais distante”.

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O contato do indivíduo com esse tema e suas repercussões na vida se dá, na leitura do estudioso, à medida que a finitude da vida se apresenta. “Para o jovem, o corpo tem que ser vivido intensamente. Na fase adulta, o corpo passa por transformações, sinais de limites, de doenças, e entramos num processo e revisão do que passou. Mas não um passado de lamentação. O movimento é de pegar elementos do passado para fazer sentido no presente”.

A mudança das relações pessoais promovida pela internet é outra condição que, na visão de Manuel, altera o comportamento de jovens em relação ao Dia de Finados.

O antropólogo dá um exemplo prático. “Meu pai me levara para ver o cemitério quando eu era criança. Eu não queria, tinha medo, mas ia. Hoje essa tradição não acontece mais com tanta intensidade, até porque, na época, não tínhamos internet, vivíamos em uma cidade pequena em que as relações sociais eram mais estreitas”.

Para Manuel, a vida, a cultura, as cidades se transformam por meio da tecnologia e para além dela e, com um contexto diferente, surgem comportamentos diferentes. “O jovem tem muito a descobrir, muito a viver no presente, a conectividade deixa o mundo mais acelerado e pessoas tem cada vez menos tempo para priorizar coisas que, no passado, eram prioritárias. Talvez a morte ainda não seja um elemento importante para o jovem no momento”, conclui.

Tribuna Livre, com informações da Gerência do Diretor do Museu Antropológico da UFG

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