A paz que Lula diz querer negociar na Europa é a rendição da Ucrânia. E ainda temos o capítulo do espião russo no Brasil
A declaração de Lula sobre a Crimeia, nessa quinta-feira,
é a demonstração mais inequívoca do seu apoio à Rússia, do criminoso de guerra
Vladimir Putin, na sua agressão contra a Ucrânia. Disse o presidente da
República brasileiro:
“Putin não pode ficar com o terreno da Ucrânia. Talvez se
discuta a Crimeia. Mas o que ele invadiu de novo, tem que se repensar. O
[presidente da Ucrânia, Volodymyr] Zelensky não pode querer tudo. A Otan não
vai poder se estabelecer na fronteira [com a Rússia].“
A Ucrânia, senhor Lula, não é uma fazenda para ter
“terreno”. É um país soberano que tem território. E a Crimeia é parte
inseparável do território da Ucrânia. Afirmar que a Crimeia pode ser
“discutida” é chancelar a invasão da Rússia em 2014, igualando o agressor e o
agredido.
Volodymyr Zelenski não quer “tudo”, senhor Lula, o que
ele quer — o que os ucranianos querem — é restaurar a soberania do seu país
sobre regiões ocupadas ilegalmente, segundo todas as leis do direito
internacional. Quanto à Otan, é perfeitamente natural que países com fronteira
com a Rússia queiram entrar para a aliança de defesa ocidental, assim como fez
a Finlândia e fará a Suécia. O que não pode, senhor Lula, é a Rússia invadir e
ameaçar bombardear com armas nucleares os seus vizinhos.
Vamos ser claros como Lula: a paz que o petista diz
querer negociar na Europa é a rendição do exército ucraniano, pura e
simplesmente. Vladimir Putin tem um capacho na Bielo-Rússia, o ditador Alexandr
Lukashenko, e tem um tchutchuca no Brasil.
O fato incontornável é que Lula e o seu partido nutrem
extrema simpatia pelo cruzada do tirano russo contra o “imperialismo
estadunidense” — estadunidense é como esquerdista de miolo mole chama
americano.
A simpatia é tanta que o secretário-geral do PT, Henrique
Fontana, e o secretário de Relações Internacionais do partido, Romênio Pereira,
não viram problema nenhum em participar de um evento do partido do criminoso de
guerra Vladimir Putin, o Rússia Unida, cujo tema era o neocolonialismo.
A sugestão do presidente brasileiro sobre a Crimeia
ocorreu logo depois da visita secreta de Celso Amorim a Moscou, no final de
março. É lícito imaginar, portanto, que a Crimeia tenha sido assunto específico
do ex-ministro das Relações Exteriores e atual conselheiro de Lula na conversa
de uma hora que ele teve com o criminoso de guerra Vladimir Putin, sobre a
possível mediação brasileira para um acordo de paz entre a Rússia e a Ucrânia.
Segundo o porta-voz do Kremlin, o reto e vertical Dmitry Peskov, reafirmou-se
no encontro o convite para que Lula faça uma visita oficial a Moscou. Bacana.
Li uma reportagem interessante a respeito dessa visita,
assinada pela jornalista italiana Maria Zuppello, especializada em cobrir
assuntos de inteligência e colaboradora no site Infobae.
Ela trata do caso do espião russo Sergey Cherkasov, que
tentou infiltrar-se no Tribunal de Haia, a corte que condenou o criminoso de
guerra Vladimir Putin por sequestrar ao menos 6 mil crianças ucranianas.
Sergey Cherkasov passou-se por brasileiro durante uma
década, viajando aos Estados Unidos e à Europa Ocidental sob a falsa identidade
de Victor Muller Ferreira. Ele foi preso na Holanda e deportado para o Brasil,
onde o despacharam para o xadrez, em abril do ano passado, condenado pelo
Tribunal de Justiça de São Paulo a 15 anos de prisão, por falsidade ideológica.
A Rússia pediu a extradição do espião Sergey Cherkasov,
dizendo que ele não é espião, não, mas integrante de uma organização
especializada em tráfico de heroína. Os russos são uns pândegos. Como aponta a
jornalista Maria Zuppello, é um expediente comum da Rússia tentar recuperar
espiões capturados no exterior sob o falso pretexto de que são apenas
criminosos comuns.
Muito bem, Celso Amorim estava em Moscou, todo faceiro,
quando o correspondente do Wall Street Journal na Rússia, o americano Evan
Gershkovich, foi preso pela polícia do criminoso de guerra Vladimir Putin,
acusado de espionagem. Jornalista conhecido, Evan Gershkovich é tão espião
americano na Rússia quanto Dilma Rousseff é espiã brasileira na China. Mas uma
das táticas de Moscou é fazer trocas de espiões russos verdadeiros por
estrangeiros acusados de espionagem que não são espiões coisa nenhuma. Evan
Gershkovich é um desses coitados. Ele entrará na pauta de Celso Amorim com o
criminoso de guerra Vladimir Putin, se é que já não entrou?
Explica-se.
Uma semana antes de Evan Gershkovich ser preso, o
Departamento de Justiça dos Estados Unidos acusou formalmente Sergey Cherkasov
de espionagem. Teria feito o seu trabalho de espião, sob a falsa identidade
brasileira, enquanto estudava Relações Internacionais em Washington. A acusação
formal é requisito para os Estados Unidos pedirem a extradição do sujeito.
Aliás, segundo os americanos, ele teria espionado igualmente o Brasil, o que
acho uma tremenda perda de tempo.
O ministro Edson Fachin, do STF, decidiu que o pedido de
extradição de Sergey Cherkasov para a Rússia só será apreciado depois que as
investigações da PF sobre ele terminarem. Nesse meio-tempo, porém, os Estados
Unidos poderiam entrar com um pedido de extradição.
Uma hipótese levantada na reportagem de Maria Zuppello é
que o Brasil de Lula poderia ter um papel na troca do jornalista americano Evan
Gershkovich pelo espião russo Sergey Cherkasov. E que a iminente visita ao
Brasil do ministro das Relações Exteriores da Rússia, o reto e vertical Sergei
Lavrov, visita combinada com o ex-ministro das Relações Exteriores brasileiro,
poderia abrir caminho para que isso ocorresse.
Vai nessa, Celso Amorim.
Por Mario Sabino