Encerrada a conferência de Baku, no Azerbaijão, diplomatas, ambientalistas e climatologistas externaram decepção com o valor estabelecido para o fundo global, de US$ 300 bilhões anuais até 2035
Um insulto. A definição do negociador-chefe da Bolívia, Diego Pacheco, sobre o texto final da Conferência das Partes sobre Mudanças Climáticas em Baku (COP29), no Azerbaijão, ainda ecoava um dia depois do encerramento da cúpula. Ministros, diplomatas, ambientalistas e climatologistas mostraram indignação com o valor estabelecido para o fundo global de mitigação e adaptação: US$ 300 bilhões até 2035, com revisão em 2030. O montante corresponde a 30% do que havia sido calculado pela Organização das Nações Unidas (ONU). “Esperava um resultado mais ambicioso”, comentou António Guterres, secretário-geral da ONU.
No ano mais quente já registrado, a COP29 também decepcionou pela falta de acordo sobre o Balanço Global do Acordo de Paris — avaliação técnica do que foi feito até agora para tentar limitar o aumento da temperatura no fim do século a 1,5ºC. Esperava-se para Baku a última etapa da análise de resultados, um passo importante para determinar como os países devem responder às deficiências identificadas.
Com a presença de 1.770 lobistas do petróleo, a conferência também deixou para a edição de Belém, no próximo ano, a decisão sobre a transição energética. A lacuna não chega a ser inesperado: em seu discurso na Sessão de Alto Nível da COP, onde os líderes dão seus recados, o presidente do Azerbaijão, Ilham Aliev, afirmou que os combustíveis fósseis eram um “presente de Deus, que não pode ser desprezado”.
Em um comunicado, Simon Stiell, chefe climático da ONU, destacou que a conferência resolveu pouco do que estava previsto. “Nenhum país conseguiu tudo o que queria, e vamos embora de Baku com uma montanha de trabalho ainda por fazer. Sendo assim, não é o momento de dar voltas da vitória.”
Direito
O G77 China reivindicava ao menos US$ 500 bilhões anuais para o fundo, metade do que economistas consultados pela ONU calcularam como necessário para ajudar os países em desenvolvimento a combater os efeitos das mudanças climáticas e fazer a transição energética. “O valor acordado é um insulto à demanda dos países em desenvolvimento. O pagamento da dívida climática é um direito dos países do Sul Global”, disse Diego Pacheco, negociador-chefe da Bolívia, citado pela agência France-Presse.
“O acordo financeiro fechado hoje Baku perverte a UNFCCC (Convenção-Quadro das Nações Unidas para Mudanças Climáticas) e subverte qualquer conceito de justiça”, avaliou Claudio Angelo, chefe de Política Internacional do Observatório do Clima. “Com a ajuda de uma presidência incompetente, os países desenvolvidos conseguiram mais uma vez abandonar as suas obrigações e fazer com que os países em desenvolvimento literalmente pagassem a conta.”
O bloco dos países menos desenvolvidos, que lutava por 30% do valor do financiamento, acusou a conferência de se deixar levar pelo lobby dos combustíveis fósseis. “Viemos de boa fé, pensando na segurança das nossas comunidades e no bem-estar do mundo. Contudo, assistimos ao pior do oportunismo político nesta COP, brincando com as vidas das pessoas mais vulneráveis do mundo. Os interesses dos combustíveis fósseis estão determinados a bloquear o progresso e a minar os objetivos multilaterais pelos quais temos trabalhado”, declarou, em nota, Tina Stege, enviada climática das Ilhas Marshall.
Professor emérito de riscos geofísicos e climáticos da Universidade College London, na Inglaterra, Bill McGuire destaca a preocupação com os resultados pífios alcançados em Baku. “Muitos cientistas climáticos sentem a mesma mistura de frustração, incredulidade e medo que eu sinto pela ausência de progresso”, afirma. “Com as emissões precisando cair em pelo menos 43% nos próximos 60 meses, o mundo precisa estar em pé de guerra e agir de acordo.”