09/11/2025

Por que há corrida na África por lançamento de satélites

'Redução no custo abriu o mercado', diz Kwaku Sumah - (crédito: Arquivo pessoal)

A queda nos custos de lançamento está dando às nações africanas a chance de colocar seus próprios satélites em órbita.

Um por um, os satélites — cada um deles incrustado com uma miscelânea de painéis solares e outros aparelhos — se separaram de sua nave-mãe.

Eles haviam decolado da Terra apenas uma hora antes, em 16 de agosto.

Os 116 satélites a bordo do veículo de lançamento foram projetados e construídos principalmente por nações e empresas já bastante conhecidos no ramo espacial — mas um deles era diferente.

Era o primeiro satélite desenvolvido pelo Senegal.

Um pequeno satélite do tipo CubeSat, nomeado GaindeSAT-1A, permitirá a observação da Terra e facilitará as telecomunicações.

O presidente do Senegal, Bassirou Diomaye Faye, disse que o lançamento era um grande passo em direção à “soberania tecnológica”.

O custo de lançamento de satélites caiu significativamente nos últimos anos, explica Kwaku Sumah, fundador e diretor administrativo da Spacehubs Africa, uma consultoria espacial.

“Essa redução no custo abriu o mercado”, ele aponta.

“Essas nações menores… agora têm a oportunidade de se envolver.”

Até o momento, 17 países africanos colocaram mais de 60 satélites em órbita.

Além de Senegal, Djibuti e Zimbábue também viram seus primeiros satélites se tornarem operacionais nos últimos 12 meses. Espera-se que dezenas de outros satélites africanos entrem em órbita nos próximos anos.

Entretanto, o continente não tem hoje instalações de lançamento espacial próprias.

E países poderosos em outras partes do mundo estão, sem dúvida, usando programas espaciais que estão surgindo na África como um meio para construir relações internacionais e afirmar seu domínio geopolítico de forma mais ampla.

Mais nações africanas podem traçar seu próprio caminho para a órbita — e além?

“É importante que os países africanos tenham seus próprios satélites”, defende Sumah, argumentando que esse tipo de projeto traz maior controle sobre a tecnologia e acesso mais fácil aos dados de satélite.

Essas informações podem ajudar os africanos a monitorar plantações, detectar ameaças trazidas por condições climáticas extremas, como enchentes, e melhorar as telecomunicações em áreas remotas, acrescenta ele.

Mas desbravar o espaço ainda é visto como “algo para a elite” na África, diz Jessie Ndaba, cofundadora e diretora administrativa da Astrofica Technologies, uma empresa de tecnologia espacial na África do Sul que projeta satélites.

No geral, os negócios de sua empresa continuam “muito lentos”, desabafa a jovem.

Dada a enorme ameaça que as mudanças climáticas representam para o continente, a tecnologia espacial deve ser usada para monitorar alimentos e recursos, ela sugere.

Uma corrida espacial africana para chegar à Lua ou a Marte, por outro lado, não seria útil: “Temos que olhar para os desafios que temos na África e encontrar maneiras de resolvê-los.”

Para Sarah Kimani, do Departamento Meteorológico do Quênia, os satélites se mostraram inestimáveis ??para ajudar especialistas como ela a rastrear condições climáticas perigosas.

Ela se lembra de ter usado dados fornecidos pela Eumetsat, uma agência europeia de satélites, para monitorar uma grande tempestade de poeira em março.

“Conseguimos localizar a direção dessa tempestade de poeira”, lembra.

Ainda este ano, ela e seus colegas começarão a receber dados de última geração da Eumetsat, o que permitirá o monitoramento de incêndios florestais e raios, entre outros.

“Isso nos ajudará a melhorar nossos sistemas de alerta precoce”, diz Kimani.

As mudanças climáticas trazem ameaças que podem surgir rapidamente — de grandes tempestades a secas extremas.

“A intensidade desses perigos está mudando”, afirma Kimani, destacando por exemplo a utilidade de dados de satélite que podem ser atualizados a cada cinco minutos.

Ela também argumenta que o Quênia — que colocou seu primeiro satélite operacional de observação da Terra em órbita no ano passado — se beneficiaria muito se tivesse mais satélites e espaçonaves.

Assim como outros países africanos em geral.

“Só a África entende suas próprias necessidades”, diz Kimani.

Atualmente, muitas nações africanas com programas espaciais novos dependem de tecnologia e especialistas estrangeiros, diz Temidayo Oniosun, diretor administrativo da consultoria especializada Space in Africa.

Alguns países enviam estudantes e engenheiros para o exterior para adquirir conhecimento em tecnologia espacial.

“O problema é que, quando eles voltam, não há laboratório, nenhuma instalação para eles”, aponta Oniosun.

O novo satélite do Senegal foi construído por técnicos senegaleses. Embora não queiramos diminuir essa conquista significativa, vale a pena notar que o desenvolvimento do satélite aconteceu em parceria com uma universidade francesa, e que a espaçonave foi lançada junto com um foguete SpaceX na Califórnia, EUA.

Europa, China e EUA se juntaram nos últimos tempos a vários programas espaciais africanos.

Isso ajuda a impulsionar a tecnologia africana, mas também serve como uma “ferramenta diplomática sensível”, diz Oniosun.

Isso o deixa “um pouco preocupado”, ele admite.

Analistas já sugeriram que os programas espaciais africanos não se restringem a levar essas nações ao espaço — eles também são, em partes, arenas onde alguns dos países mais poderosos do mundo competem entre si.

Já Sumah está otimista sobre a situação.

“Podemos jogar esses diferentes poderes uns contra os outros para obter os melhores negócios”, diz ele.

Tanto os EUA quanto a China consideraram as implicações “estratégicas” de se envolver em projetos espaciais africanos, diz Julie Klinger, da Universidade de Delaware.

“Isso traz consigo uma necessidade cada vez maior de atualizar tratados e estratégias globais em torno da manutenção de um ambiente espacial pacífico e administrável”, acrescenta ela.

Mas também há oportunidades. Klinger observa que lançamentos a partir de regiões equatoriais podem não exigir tanto combustível — e por isso bases espaciais africanas poderiam ter um papel importante a desempenhar nas próximas décadas.

Por isso, o Centro Espacial Luigi Broglio, construído pela Itália na costa do Quênia, pode voltar a funcionar um dia. Os últimos lançamentos lá ocorreram na década de 1980.

No final das contas, podemos esperar ver uma atividade crescente de nações africanas no espaço.

“Temos cerca de 80 satélites atualmente em desenvolvimento”, comemora Oniosun. “Acho que o futuro da indústria é muito brilhante.”

Tribuna Livre, com informações da BBC News

Deixe um comentário

Leia também
aisha-bowe-blue-origin-041425-1-4ca5597d02804a429554c51def058c6d-1200x675-1
Mulher negra rompe barreiras e inspira futuras gerações no espaço
iphone-air-perfil-scaled-1
Iphone air: aparelho ultrafino não atinge expectativas de venda
SamAltman-1200x675-1
Altman e os acordos da openai: um risco calculado ou aposta audaciosa?
tech-james-watson-dna-1200x675-1
Pai da genética: james watson, descobridor do dna, falece aos 97 anos
O narcossubmarino transportando 1,7 toneladas de cocaína que foi interceptado no Atlântico
O narcossubmarino transportando 1,7 toneladas de cocaína que foi interceptado no Atlântico
Avião de carga cai e deixa sete mortos nos EUA
Avião de carga cai e deixa sete mortos nos EUA
Trabalhador fica preso sob escombros após desabamento de torre em Roma
Trabalhador fica preso sob escombros após desabamento de torre em Roma
Shein proíbe venda de bonecas sexuais após indignação com aparência infantil dos produtos
Shein proíbe venda de bonecas sexuais após indignação com aparência infantil dos produtos
Relatório entregue a governo Trump por Castro pede sanções antiterrorismo contra Comando Vermelho
Relatório entregue a governo Trump por Castro pede sanções antiterrorismo contra Comando Vermelho
Tarifaço terá audiência decisiva na Suprema Corte nesta quarta, e Trump diz que não vai comparecer
Tarifaço terá audiência decisiva na Suprema Corte nesta quarta, e Trump diz que não vai comparecer
Ataque a trem na Inglaterra: polícia descarta motivação 'terrorista'
Ataque a trem na Inglaterra: polícia descarta motivação 'terrorista'
Ataque dos EUA contra suposta embarcação 'narco' deixa três mortos
Ataque dos EUA contra suposta embarcação 'narco' deixa três mortos

Bolsonaro é condenado e flávio reage: ‘uma farsa’

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) criticou a decisão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) que rejeitou, por unanimidade, o recurso da defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro. A medida mantém a condenação de 27 anos e 3 meses imposta ao ex-presidente. Para o senador, a decisão é uma “farsa”.

Leia mais...

Título: Alerta em Belém: Autoridades apuram possível plano de ataque a usina Conteúdo: O governo federal está investigando uma possível ameaça de ataque a uma empresa de energia localizada em Belém, no estado do Pará. A informação sobre a potencial ação criminosa foi inicialmente comunicada pela própria empresa às autoridades

Leia mais...

A sua privacidade é importante para o Tribuna Livre Brasil. Nossa política de privacidade visa garantir a transparência e segurança no tratamento de seus dados pessoais.