Até domingo à noite, a votação dos vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva estava mantida para quinta-feira, mas algumas ideias virão — como, por exemplo, dedicar as verbas decorrentes desses vetos às ações de prevenção de desastres
As demonstrações de unidade política, neste fim de semana, em decorrência da tragédia que se abate sobre o Rio Grande do Sul, indicam uma trégua no embate político da polarização e na briga pelo Orçamento. Pelo menos por enquanto, a ordem é trabalhar na busca de soluções emergenciais para atender a população do estado, e criar mecanismos de prevenção a desastres climáticos — algo que andava meio à margem, com o debate voltado à briga pelo poder de mando sobre os recursos da União.
Começa a se desenhar algo nos seguintes termos: se o Congresso quer ter poder sobre as verbas orçamentárias, os parlamentares terão que dedicar parte dos recursos que carimbam a esses serviços emergenciais e preventivos. E, da parte do Poder Executivo, é deixar de lado o conta-gotas das emendas e permitir que recursos, propostos pelos políticos para esse fim, cheguem àqueles que precisam.
Essa será a toada desta semana, que previa um duelo sobre o Orçamento no plenário do Congresso, na análise dos vetos. O tema será discutido nesta segunda-feira (6). Até domingo à noite, a votação dos vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva estava mantida para quinta-feira, mas algumas ideias virão — como, por exemplo, dedicar as verbas decorrentes desses vetos às ações de prevenção de desastres.
Sem previsão
“Hoje, não se tem uma rubrica para prevenção de desastres climáticos. Só se aciona a Defesa Civil quando há óbito. Todos os anos que colocamos isso (no Orçamento), o próprio Poder Executivo veta. Tentei fazer em 2014, quando fui relator pela primeira vez, e não consegui. É lamentável que não se tenha um crédito extraordinário para prevenção de desastres. E os parlamentares precisam dedicar emendas para isso, exercendo o semi-presidencialismo na sua plenitude”, lamenta o deputado Danilo Forte (União Brasil-CE), que relatou a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano.
Se uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) serviu para tornar as emendas impositivas — ou seja, de liberação obrigatória —, a ideia de muitos deputados e senadores é buscar o mesmo sistema para resolver questões relacionadas às emergências climáticas. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), pretende debater na quarta-feira um texto para destinar parte das emendas à prevenção de desastres.
No Senado, o senador Alessandro Vieira (MDB-SE) propôs outra PEC para criação de um “orçamento de guerra” para, tal e qual no período da pandemia, atender crises como a que assola os gaúchos atualmente. Já Danilo Forte pretende propor que se use o lucro de Itaipu, na casa dos R$ 3 bilhões, para ações de prevenção e emergência relacionadas às mudanças climáticas.
Todas essas ações têm o intuito de mostrar os parlamentares estão dedicados ao atendimento à população. São vários casos de alagamentos, reflexos das mudanças climáticas no país ao longo dos últimos anos. E nenhum deles tirou os políticos do embate partidário e da luta pelo poder.
Agora, porém, as pesquisas mais reservadas encomendadas por muitos indicam que é preciso que os atores se conectem com a realidade, sob pena de perderem eleitores. Na semana passada, por exemplo, apesar de boa parte do Rio Grande do Sul já estar debaixo de água, o governo federal tinha decidido manter o Concurso Nacional Unificado, que seria realizado ontem. Mas, na sexta-feira, anunciou o adiamento.
A deputada Daiana Santos (PCdoB-RS) tinha sido incisiva, na reunião da bancada, em Porto Alegre, antes de o governo adiar o certame: “Como é que a gente não está sendo sensível o suficiente para entender que é um momento de calamidade? Isso fala muito do distanciamento da realidade que estamos tendo”, alertou.
Foi preciso Lula ir ao estado para, depois de ver os estragos, concluir que não havia condições de realizar provas — e que a situação ainda se agravaria mais pela continuidade das chuvas.
“Bolha das redes”
A tragédia do Rio Grande do Sul levou muitos políticos a refletir que a classe, como um todo, tem dedicado muito tempo às “bolhas” das redes sociais, onde os algoritmos comandam, deixando de lado a tarefa primordial de atendimento à população. Muitas vezes, se perdem em discussões estéreis de briga por cargos e poder, sem levar em conta as necessidades reais dos brasileiros ou atentar para temas que atingem diretamente a vida das pessoas — como prevenção de desastres decorrentes das mudanças climáticas.
Nas comissões da Câmara dos Deputados, por exemplo, está cada dia mais difícil conseguir levar adiante a discussão de projetos, uma vez que viraram palco da polarização e funcionam mais para audiências públicas de ministros do que discussões de grandes temas nacionais. Nesses cenários, todos os temas importantes e cruciais têm seguido para grupos de trabalho, comissões especiais ou diretamente para o plenário.
E serviços relacionados aos grandes temas não faltam — na área de desastres ambientais, conforme alertam alguns especialistas, são vários. É preciso, por exemplo, encontrar soluções de engenharia para aprofundar leitos dos rios para que não transbordem diante das chuvas volumosas; ampliar sistemas de diques; e de retirada das pessoas das áreas de risco. São ações integradas e que devem ser estudadas para todas as regiões do país.
Alguns, porém, consideram difícil a trégua na polarização, com eleições municipais despontando no horizonte. Embora o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), tenha dito que não é hora de procurar culpados e se mantido distante das notas emitidas pelo seu partido criticando o governo Lula, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, partiu para cima da gestão Bolsonaro.
“Se não tivéssemos quatro anos de apagão em termos de política climática, de prevenção, poderíamos estar em outra situação”, criticou.
Tribuna Livre, com informações da Agência Câmara