A plataforma de jogos Roblox, que registra 112 milhões de usuários diários, implementará a verificação facial obrigatória para acesso ao chat a partir de janeiro de 2026. A medida, inédita no setor, reacende o debate sobre segurança digital para crianças, privacidade e a responsabilidade das empresas. Embora a empresa se apresente como pioneira e busque estabelecer um novo padrão no mercado, especialistas alertam sobre os riscos de uma falsa sensação de segurança, possíveis impactos no desenvolvimento infantil e a necessidade de uma regulamentação robusta.
A decisão ocorre em um momento em que o tema da segurança digital para crianças e adolescentes ganha destaque. Em setembro de 2025, o Senado Federal alertou para os perigos que espreitam os jovens no ambiente digital, como assédio e exposição a conteúdos inadequados. Paralelamente, o Governo Federal publicou guias sobre o uso de telas e jogos digitais, alertando para os riscos de vício, cyberbullying e contato com estranhos. No mesmo período, entrou em vigor o ECA Digital (Lei nº 15.211/2025), que atualiza o Estatuto da Criança e do Adolescente para o ambiente online, estabelecendo que as plataformas devem adotar mecanismos eficazes de verificação de idade, mas sem transformar os dados coletados em instrumentos comerciais ou de vigilância.
Segundo a Roblox, a decisão está atrelada ao perfil de seus jogadores, majoritariamente crianças e adolescentes de diferentes faixas etárias, o que exige novas formas de proteção para garantir interações seguras. A empresa afirma que a biometria surge como resposta a esse desafio, considerando a segurança fundamental em todas as suas ações e buscando constantemente inovar e evoluir sua abordagem.
A empresa afirma que vem testando tecnologias de verificação de idade há meses em diferentes recursos da plataforma, o que deu segurança para ampliar o uso da biometria, garantindo que a solução pudesse ser aplicada em larga escala sem comprometer a experiência dos usuários. A Roblox acredita que está estabelecendo um novo padrão de segurança digital e espera que outras plataformas sigam o mesmo caminho.
A companhia reforça que o processo é rápido, seguro e realizado pelo aplicativo, com imagens processadas por uma fornecedora e excluídas imediatamente após a verificação. A empresa nega que o recurso tenha relação com vigilância, afirmando que o objetivo é garantir que os jogadores tenham a idade que declaram ter para que possam interagir com pessoas de idade semelhante.
No mercado gamer, a Geração Alpha, crianças de até 14 anos, é a que mais preocupa quando o assunto é segurança digital. Pesquisas apontam que grande parte dos jogadores dessa faixa etária têm entre 10 e 15 anos, idade em que o consumo de jogos digitais se torna rotina. O engajamento é intenso, com muitos jogando online diariamente e dedicando diversas horas semanais aos games, participando ativamente de comunidades digitais e interagindo com desconhecidos.
Para especialistas, a decisão da Roblox reflete uma tentativa de responder a pressões externas e críticas sobre a falta de proteção infantil. No entanto, alertam que a biometria não é uma solução definitiva, pois jogos como Roblox são ecossistemas sociais. A faixa etária não garante comportamento, sendo necessário considerar a diversidade cultural e social. A tecnologia pode ser burlada e não é uma “bala de prata”. O letramento digital contínuo é essencial, não apenas para crianças, mas também para pais e avós, que muitas vezes não compreendem os riscos do ambiente digital.
Juridicamente, a coleta de dados biométricos de crianças e adolescentes precisa ser acompanhada com extremo cuidado e transparência, com auditorias independentes e relatórios claros. É preciso apresentar provas que demonstrem o cumprimento das obrigações, sob o risco de criar regras que não se consegue avaliar se estão sendo cumpridas. As leis estabelecem limites claros: os dados não podem ser usados para fins comerciais ou vigilância massiva. O grande desafio será regulamentar de forma equilibrada, garantindo proteção sem violar direitos fundamentais. A responsabilidade é compartilhada entre famílias, Estado e empresas.
Psicólogos avaliam que a verificação facial é uma iniciativa relevante para reduzir riscos, mas alertam para os paradoxos. Ao acreditar estar protegido, crianças e responsáveis podem ter a falsa impressão de que basta a plataforma implementar o verificador e relaxarem outras práticas de supervisão e educação digital. A proteção técnica ajuda, mas não substitui o desenvolvimento de educação e segurança digital.
Um dos pontos mais críticos é a normalização da biometria infantil, que pode gerar dessensibilização e, no futuro, menor resistência em entregar dados biológicos em troca de conveniência ou entretenimento. Os responsáveis não devem terceirizar a segurança, e a biometria deve ser vista como aliada técnica, mas nunca substituir o diálogo sobre ética, privacidade e riscos humanos. A educação digital contínua é fundamental.
Fonte: forbes.com.br











