27/07/2024

Minas entra em alerta para risco máximo de incêndios; entenda a ameaça

Estado chega ao período de seca mais propenso ao fogo sob risco de dobrar os quase 2 mil focos detectados por satélites desde o início da estação

O número de focos de incêndios em Minas Gerais pode dobrar até o fim da atual estação de estiagem (de abril a setembro), caso o ritmo histórico médio dos últimos 45 dias desse período se mantenha, o que desperta alerta e preocupação entre especialistas e combatentes. As projeções de incêndios em vegetação, como o que atingiu ontem o Parque Estadual Serra Verde, na Região Norte de BH, são feitas com base nos registros de satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e encontram respaldo também na avaliação do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), que prevê menos chuvas do que nos últimos três anos até outubro.

A apreensão se agrava em meio a um cenário de alterações no clima e previsões de aquecimento das temperaturas globais, já alertadas pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), da Organização das Nações Unidas (ONU). Apesar do risco, e da perspectiva de destruição que vem em seu rastro, bombeiros e órgãos estaduais de combate a incêndios se dizem preparados para as semanas mais críticas da temporada.

Segundo estatísticas do Inpe, a média de focos de calor – como são tecnicamente definidas as ocorrências captadas em satélite – entre abril e 15 de agosto nos últimos 10 anos (2013/2022) foi de 33,22% do total de registros do período de estiagem. Ou seja, nos 45 dias restantes, o número de focos representou 66,78% do total.

Mantido esse ritmo na atual estação, os 1.941 focos registrados entre abril e 15 de agosto de 2023 podem se multiplicar duas vezes, com a ignição de cerca de 3.900 novos focos, totalizando mais de 5.800 possíveis pontos de incêndio. Se essa projeção se efetivar, será o quarto pior quadro em 10 anos, perdendo para 2021 (9.932 focos), 2019 (6.560) e 2014 (6.179).

As mesmas estatísticas mostram que o mês de setembro é crítico para a ocorrência de queimadas e de incêndios florestais, tendo sido responsável pela média de 51,91% dos focos de calor registrados pelo Inpe nos últimos 10 anos no período de seca, muito à frente de agosto (21,72%) e julho (11,97%).

Efeitos de El Niño em solo mineiro

Neste ano, com o fim do fenômeno La Niña (redução da temperatura do Oceano Pacífico equatorial) e a vigência de El Niño (aumento da temperatura na mesma região oceânica), segundo especialistas do Inmet, a propensão de chuvas com duração menor e mais concentradas pode favorecer as queimadas sobretudo em setembro, para quando são esperadas as primeiras precipitações da primavera (23 de setembro a 22 de dezembro).

“A perspectiva agora é diferente dos três últimos anos. A tendência é de início de primavera com pancadas de chuva isoladas nos fins de tarde, devido ao intenso calor, provocado pelos efeitos do El Ninõ em Minas Gerais. Uma situação diversa de quando tivemos La Niña, com chuvas mais constantes e volumosas. Essa questão, no passado recente, ajudou a reduzir as condições propícias de incêndios, que retornam agora”, afirma o meteorologista Claudemir de Azevedo, do 5º Distrito de Meteorologia do Inmet.

Bombeiros entre a ação e a prevenção

O Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais contabiliza, entre abril e o último dia 16 de agosto, 9.185 atendimentos a incêndios em vegetação no estado, o que inclui focos em lotes vagos, sendo 7.263 entre abril e julho. O número de mobilizações de militares nessas ocorrências é 17% menor que a média de chamados dos últimos quatro anos (2022 a 2019) de 8.760, mas a estatística não leva em conta que em um mesmo acionamento os militares podem lidar com vários focos de fogo.

A própria corporação sabe que a época é crítica, e por isso se pauta pelo Plano de Enfrentamento ao Período de Estiagem para o ano de 2023, em que estão sendo monitoradas e georreferenciadas as áreas de risco. Têm sido realizadas também campanhas de conscientização em escolas e comunidades, especialização de efetivo, parceria com prefeituras, fiscalização, patrulhamento, vigilância, treinamento e requalificação de brigadas florestais e treinamento dos Núcleos de Incêndios Florestais (NIFs), em um total de 17 em todo o estado.

Quando a prevenção falha, em resposta a queimadas em vegetação o Corpo de Bombeiros informa estar preparado com unidades especializadas, como o Batalhão de Emergências Ambientais e Resposta a Desastres (Bemad). A corporação também usa aeronaves para combater incêndios florestais em todo território mineiro.

“São três helicópteros, que além de combater o fogo diretamente, atuam no transporte de tropa e na logística do combate aos incêndios florestais. O último adquirido foi em 2022, um Air tractor PR-FNO fabricado em 2010, que contribui para um ganho de autonomia de três horas de voo e capacidade de 1.893 litros de água, permitindo multiplicação da efetividade no combate”, informa a corporação.

Mobilização necessária

Os incêndios em vegetação estão entre as ocorrências mais atendidas pelos bombeiros de Minas. Pouco mais de 41% dessas ocorrências se dão em lotes vagos. Por esse motivo, está em andamento a Operação Alerta Verde, para disseminar uma cultura de prevenção, conscientização e mobilização da população para evitar o fogo nessas propriedades.

“Boa parte dos incêndios em lotes vagos pode perfeitamente ser evitada, mas é necessário um esforço e envolvimento maior por parte das comunidades, no sentido de apoiar a fiscalização e denunciar práticas irregulares. A população mineira pode ser a maior aliada do Corpo de Bombeiros nesse esforço de reduzir os incêndios e primar pela segurança dos moradores e qualidade do ar que respiramos”, informa a corporação.

Treinamento

Com apoio do Gabinete Militar do Governador, por meio da Coordenadoria Estadual de Defesa Civil, e do Instituto Estadual de Florestas, começaram as ações do Corpo de Bombeiros para o Programa de Treinamento e Capacitação de Brigada Florestal Municipal. O objetivo é melhorar a capacidade de resposta do governo estadual e de prefeituras diante dos incêndios florestais. Neste ano, o programa está capacitando 40 municípios e suas equipes de brigadas, com conhecimento técnico que deve ampliar a capacidade de resposta a incêndios em várias regiões.

Temperaturas e risco em elevação

Responsável por avaliar e sintetizar o conhecimento científico sobre as mudanças climáticas e seus impactos, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) calcula cenários que podem intensificar os incêndios florestais no território mineiro. Nos quadros de modelagens, o indicativo é de alta probabilidade de elevação das temperaturas e de aumento da frequência de eventos de calor extremo na região. Isso amplia também, por outro lado, os riscos de inundações, transbordamentos e deslizamentos causados pelo despejo repentino de temporais.

Para se ter uma ideia dos impactos na área mais povoada de Minas Gerais, que é a Grande BH, com uma elevação global em cenário otimista de 1,5°C até 2030, as temperaturas na região poderiam ser ampliadas em 1,9°C. No caso mais pessimista, com as temperaturas do planeta sendo ampliadas em média 4°C, a região poderia ter um aquecimento de 4,8°C.

Na mesma linha que o Corpo de Bombeiros aponta, de que a quase totalidade dos incêndios é provocada por ações criminosas, o presidente da Associação para a Gestão Socioambiental do Triângulo Mineiro (Angá), Gustavo Malacco, afirma que é importante conter essa devastação, e alerta para situações irreversíveis. “Temos de entender que um possível aumento de 1,5°C (nas temperaturas globais) não representará só isso em Minas Gerais e no cerrado; teremos até 2°C, e isso já é realidade”, adverte.

Ele destaca a urgência de mudança de comportamentos e práticas. “Temos também pela frente um super El Niño. Se nada mudar, se não pararmos com emissões de gases de aquecimento e degradação, essa será a nossa nova realidade. O caminho é conter desmatamentos e cessar as emissões, ou estaremos condenados”, avalia.

O presidente do Instituto Diadorim – organização da sociedade civil que promove estudos e projetos para recuperação de áreas degradadas e defesa do cerrado –, Gustavo Gazzinelli, afirma que, além das mudanças climáticas, é preciso estar atento às causas criminosas de incêndios. “Falta consciência das pessoas e existem práticas criminosas até de grandes empresas. Em áreas de interesse, por exemplo, minerárias, se ateia fogo e se diz que a vegetação não é mais nativa ou que a empresa é que precisa tomar conta, pois o Estado não consegue. Acontecimentos muito fortuitos, muito providenciais e que ajudam a descaracterizar um local de vegetação que tinha de ser preservada”, aponta.

O ambientalista também critica a utilização de queimadas como meio de abertura de terrenos, em atitudes que avançam para situações nas quais as chamas se alastram sem controle.

Combate nos últimos dias de agosto de 2022 na Serra da Moeda, na Grande BH: ao lado de setembro, segunda quinzena do mês concentra mais de dois terços das ocorrências –

 crédito: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press – 28/8/2022

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

7R contabilidade e assessoria empresarial Santa Maria Brasilia DF
Leia também
Copa do Brasil: ministérios fazem ação conjunta contra racismo no futebol
Copa do Brasil: ministérios fazem ação conjunta contra racismo no futebol
VACINA
Dengue: Butantan desenvolve vacina em dose única
MARCO TEMPORAL
Com 5 a 2 contra o Marco Temporal, STF retoma análise do tema na 5ª
MORAES
Moraes manda soltar 4 presos por suspeita de fraude em cartões
BAHIA
Sobe para 9 número de suspeitos mortos em operação policial na Bahia
PREFEITO CASTRADOR
Solidariedade expulsa prefeito que sugeriu castrar mulheres no RJ
rio
Prefeito de cidade no RJ sugere castrar mulheres para controlar nascimentos
BRASIL
Ministério cria GT para frear violência contra indígenas no Amazonas
LULA
Lula anuncia que prefeituras vão receber, no mínimo, repasses de 2022
NUNES
Nunes Marques vota para condenar réu do 8 de janeiro a 2 anos e seis meses de prisão
LULU
Lula dá posse a novos ministros em cerimônia fechada no Planalto
RS
Sobe para 47 número de mortos pelas chuvas no Rio Grande do Sul

PF abre investigação para apurar ataque cibernético em Ministério

Criminosos que atuam pela internet realizaram invasão nos sistemas do Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos A Polícia Federal abriu uma investigação preliminar para apurar o ataque cibernético contra sistemas internos e administrativos do Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos. A investida criminosa ocorreu na terça-feira

Leia mais...

Juiz determina que médica que sequestrou bebê continue na prisão

Audiência de custódia foi realizada no Fórum de Itumbiara na manhã desta quinta-feira (25/7) O processo sobre a médica Cláudia Soares Alves, presa em flagrante pelo sequestro de um recém-nascido, no Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia (HC-UFU), na terça-feira (23/7), correrá sob segredo de Justiça. A decisão

Leia mais...

Divulgado edital para as eleições de gestores escolares

Objetivo é preencher as vagas remanescentes de gestores das unidades de ensino da rede pública O edital com as normas do processo eleitoral para a escolha de gestores da rede pública de ensino do Distrito Federal foi publicado nesta quinta-feira (25) no Diário Oficial do DF (DODF). O objetivo do

Leia mais...

A sua privacidade é importante para o Tribuna Livre Brasil. Nossa política de privacidade visa garantir a transparência e segurança no tratamento de seus dados pessoais.